“A FELICIDADE, DESESPERADAMENTE” – André Comte-Sponville
Reflexão de Ubirajara T. Schier
Podemos dizer que a busca pela felicidade é a busca de não somente todas as pessoas, mas também é a busca dos filósofos! Enquanto aos primeiros essa busca se submete aos princípios e valores particulares de cada um, ao filósofo ela precisa se submeter, obrigatoriamente, também à verdade. É por isso que para os filósofos essa tarefa é ainda mais árdua: pois para estes serve apenas a felicidade verdadeira enquanto que, para os demais, também as ilusões e distrações que a vida proporciona. Para se distinguir uma da outra primeira é preciso, para os filósofos, sabedoria.
Precisamos nos importar em reconhecer primeiramente, as razões da nossa infelicidade. Me parece óbvio que, se buscamos a felicidade, devemos estar infelizes. Também me parece coerente dizer que a intensidade da busca pela felicidade reflete a intensidade de sua ausência da mesma forma como nossa sede nos faz buscar por água: quanto mais sede temos, mais rápido precismos satisfazê-la. Por isso, quanto menos felizes, mais felicidade desejamos.
O desejo é uma das razões que nos mantém infelizes, enquanto buscamos algo que acreditamos que vá nos trazer felicidade. Entretanto, quando conseguimos esse algo, será que somos felizes? Por quanto tempo? Eu diria que durante um certo tempo. Depende muito das características do objeto de desejo. Penso que seria mais ou menos segundo um provérbio chinês anônimo: “Se você quer ser feliz por uma hora, tire uma soneca; por um dia, vá pescar; por um mês, case-se; por um ano, herde uma fortuna; pela vida inteira, ajude os outros.” Somos portanto infelizes, não somente enquanto desejamos algo que nos falta, mas também algum tempo depois, quando nos entediamos quando nada nos falta. Seria esse o momento que podemos definir como a felicidade verdadeira?
A esperança – embora muito parecida com o desejo – é ainda mais nociva. Se no desejo tínhamos certo prazer e alegria, ainda que momentâneos, na esperança nos omitimos da responsabilidade pela realização daquilo que queremos. Encontramos na vontade uma força contrária à esperança, que ocorre no instante em que assumimos a responsabilidade pela realização do que queremos e desejamos. Na vontade somos protagonistas da nossa história enquanto que, na esperança, antagonistas dela. E é aí que reside a grande diferença: enquanto na esperança esperamos, na vontade fazemos. O realizar consiste no fazer. Na esperança, podemos até por ventura – sorte talvez – ter nosso desejo alcançado, mas não será uma conquista. O prazer e a alegria na realização de nossos desejos serão proporcionais à nossa participação em conquistá-los.
Assim, quer tenhamos um pequeno ou maior momento de felicidade, seja pela sorte de termos uma esperança atendida ou pelo mérito da nossa vontade realizada, ainda poderíamos considerá-la como algo temporal e passageiro. Pergunto se seria essa a felicidade verdadeira. Acredito que não. Acredito que deixamos escapar uma felicidade ainda mais verdadeira: que é aquela que ocorre quando, eventualmente, também gostarmos do que fazemos. Me refiro à felicidade como a encontrada por alguém, também durante a escalada de uma montanha, e não apenas quando na chegada ao cume. Quando isso ocorre, chegar ao cume é um desejo, que ainda que não aconteça, já se realizou durante a subida. A felicidade verdadeira me parece ser, portanto, muito mais o caminho realizado do que propriamente a chegada.
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